8.4.22

como decidi ser historiadora

Estava conversando com uma amiga e relembrei os motivos que me levaram a querer ser historiadora. Eu acreditava que cursando História eu saberia melhor como ambientar minhas histórias ficcionais em diferentes contextos, períodos e lugares. Isso seria ótimo para que eu me tornasse uma boa escritora e roteirista. Mas esse é só um dos muitos motivos que fizeram eu tomar essa decisão de cursar História. E eu tenho certeza que ainda existem outros muitos motivos que hoje ainda não enxergo.


Sobre os que eu enxergo: eu também achava que teria a resposta se Deus existe ou não. Eu pensava: "se eu estudar História, eu vou saber se aconteceu ou não isso tudo que a religião me diz". Eu estudava em escola católica, tinha 14 anos na época (ano de 2004), e estava na dúvida se Deus existia ou não. Lembro até que o meu professor de história era católico e isso me fazia achar que provavelmente Deus existia.

Nesse mesmo período, eu estudei os fascismos e o nazismo na escola. Tinha saído o filme “Olga” e o professor levou a gente pra ver no cinema. Eu fiquei intrigadíssima com o tanto de gente que apoiou o nazismo e achei que fazendo história, eu também ia entender como que tanta gente foi a favor de uma coisa como o nazismo e como que levavam a sério aquele homem esbravejando nos discursos. A gente também viu o filme “O Pianista” na escola e eu fiquei muito envolvida com o tema. Queria saber tudo sobre.

O primeiro livro que eu comprei em uma Bienal do Livro, aqui no Rio, foi justamente nesse ano e é um livro com Hitler na capa, chamado “Os ditadores mais perversos da História“. Era ver o Hitler na capa de um livro e eu queria ler, porque eu queria entender. Minha mãe chegou a dizer que as pessoas podiam achar esquisito o meu interesse. Lembro de outros episódios que me intrigaram também, mas o fato é que estes questionamentos durante a minha pré-adolescência e o meu interesse em História me fizeram perceber até bem cedo que eu queria estudar esse negócio.

No Ensino Médio, eu tive pela primeira vez uma professora de História, uma mulher me ensinando aquilo tudo. Eu a tive como modelo, eu pensava “quero ser igual a ela“. Também fiz um trabalho sobre a ditadura chilena, que me deixou muito interessada nas ditaduras na América Latina. Eu estudava em escola técnica voltada para o ensino de química, e o lugar de desprestígio que as ciências humanas ocupavam lá me aborrecia muito. Ali eu cravei: vou mesmo ser professora de história.

Quando terminei o técnico e fui fazer o vestibular, eu já era uma completa apaixonada por História. Quando estava perto do resultado do vestibular sair, meu avô paterno teve um AVC e foi internado no hospital Souza Aguiar, que ficava perto do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da UFRJ. Após uma visita ao meu avô, meu pai quis me levar até o Instituto. Acho que a caminhada distraiu ele da dor, sabe? Quando a gente chegou lá, ele disse que era ali que eu ia estudar. Eu concordei. Era ali mesmo.

Eu fui aprovada e lembro até hoje que o dia da minha matrícula foi também o dia do enterro do meu avô. Eu fui direto do enterro do meu avô para o Instituto fazer a matrícula. Lembro até que uns veteranos estavam chamando os calouros para ir ao bar, o tal BDP, o Bar da Praça, na Praça Tiradentes (que eu iria frequentar muito durante a graduação). Eu disse que não ia porque tinha acabado de sair de um enterro. Ficou um climão, mas eu tinha falado normal. Eu acabei rindo disso mais tarde.

Pois bem, fiz o meu bacharelado e minha licenciatura lá, também fiz o meu mestrado no mesmo lugar e hoje continuo ligada ao Instituto, como membro de um núcleo de pesquisa. Diferente do que a Gabriela de 14 anos achava, a gente não aprende na graduação se Deus existe ou não. O nazismo também não virou meu tema de pesquisa, nem as ditaduras militares na América Latina, como eu achava que seria. Mesmo assim, eu imagino que a Gabriela de 14 anos ia olhar para a Gabriela de hoje e ficar bem feliz por ela ter virado historiadora, professora e escritora. Ela ia pensar “UAAAAAU! No futuro eu vou saber se Deus existe!”.

27.6.21

observações sobre Léo Áquilla

Este texto foi originalmente publicado no blog Em Quantos no dia 3 de setembro de 2012.

Léo Áquilla foi um dos participantes da quinta edição do reality show da Record, A Fazenda. Até então eu nunca havia escutado o seu nome - e também nunca havia assistido ao reality. Um breve comentário sobre o programa: É mais interessante e mais elaborado que o Big Brother ao envolver pessoas que vivem no meio artístico e exigir o cumprimento de tarefas com os animais e com a limpeza da casa e do local. Se alguém não cumpre uma tarefa, o grupo todo acaba levando punição. Mas não é do programa que quero falar, então, voltemos ao Léo Áquilla.

Léo Áquilla é uma drag queen. Como disse no programa: "Sou mulher do ano 2000: peito, bunda e piu piu." Tem dois filhos, um natural e um adotivo. E uma história interessante pra contar. E foi o que fez no programa.

Léo falou que apanhava todos os dias na escola, porque era nítido desde criança a sua homossexualidade e, como as demais crianças notavam, ele sofria com isso. Falou que gostar de homens e de se vestir como mulher nunca foi uma escolha sua e sim algo natural. Comentou que o fato de um programa de audiência num canal de TV aberta ter convidado uma travesti para participar do programa já mostra uma mudança de mentalidade nas pessoas. 


Dentro da casa, Léo comentou o fato de que nas suas entrevistas, durante o seu trabalho e os seus shows, ele é sempre muito divertido, animado, engraçado. E que as pessoas dentro da casa, ali no reality, estranhavam o fato dele nao ser assim no dia a dia. Ele explicava que uma coisa é a personagem dele e outra quem ele é como pessoa, e que as pessoas esperam que travestis sejam sempre pessoas que gostam de chamar atenção para si.

Quando criticada sobre a sua postura de "amar todo mundo" dentro do programa, ela disse que isso vem exatamente por ser como é. Isso criou nela uma cobrança extrema para sempre agradar as pessoas, para que as pessoas gostassem sempre dela, porque lógico, sempre esteve acostumada a não agradar. A ouvir todo tipo de besteira na rua. Ser desrespeitada, sofrer preconceito.

Por isso, Léo foi acusado de se fazer de vítima e contar histórias tristes para tentar ganhar o programa com o voto do público. Sobre isso, Léo disse "Mas se eu não falar isso sobre a minha vida, vou falar o que? Infelizmente são essas as histórias que eu tenho pra contar." Não acho que Léo se fez de vítima. Ele é vítima. Dizer que ele "se faz de", é se negar a ouvir uma triste realidade, admitir que ela existe e refletir. Respeito as pessoas que não gostam de reality shows, mas olha, acho o máximo a gente ligar a TV em um programa de grande audiência e poder ouvir isso.

OBS.: Léo Áquilla fez Silvinho se perguntar durante o programa o por que dela não ter adotado um nome feminino. Eu notei que às vezes Léo fala de si no masculino, às vezes no feminino. Fiz o mesmo durante esse texto.

12.6.21

para quem detesta ação

Este texto foi originalmente publicado no blog Em Quantos no dia 28 de maio de 2012.

"Plano de Fuga" começa com um bandido (Mel Gibson) fugindo da polícia dos EUA após roubar uma boa quantia em dinheiro. Na fuga, ele ultrapassa a fronteira e acaba sendo preso pelos policiais mexicanos. A quem pertence o dinheiro roubado e quem afinal é o personagem principal são algumas das questões do filme. 

O personagem, que fará todas as suas ações usando o nome do atual marido de sua ex-esposa, fica em um presídio chamado de "El Pueblito", que funciona como uma cidade de presidiários. Não demora muito para o personagem perceber que há uma hierarquia naquela "cidade", onde os próprios bandidos possuem armas e alguns tem acesso à um estilo de vida consideravelmente melhor do que outros. Quem vai ajudar o personagem de Mel Gibson a compreender melhor o local é um menino que vive ali com a sua mãe. 

O fato de que o menino é protegido pelos criminosos mais poderosos de "El Pueblito" é mais um dos mistérios do filme. Assim, o filme nos apresenta uma dupla onde um pode ajudar o outro e onde nós, espectadores, ficamos tentando desvendar todos os segredos da história. Mas, cuidado, o filme não é um suspense! É um filme de ação!

Eu não sou fã desse gênero e acabo detestando 90% dos filmes de ação que eu assisto, mas desse eu até gostei. Não digo que eu veria outras vezes, mas o que eu quero dizer é que eu consegui ficar envolvida pela história até o seu final - final que, aliás, não é imprevisível. As cenas de ação, lógico, contam com todas as "mentiras" das quais esses filmes usam e abusam. Vale dizer, para quem detesta ação como eu, que o filme valeu muito mais pela sua história e todos os pontos que precisam ser explicados e resolvidos do que pela pela ação. 

Também vale dizer que Mel Gibson é ator, produtor e roteirista do filme. E que embora o filme se passe dentro de um presídio mergulhado em corrupção, no México, com todo um visual que nos parece sincero, o objetivo desse filme está longe de ser mostrar a realidade.

4.6.21

a menina do copo

Este texto foi originalmente publicado no blog Em Quantos, em 14 de maio de 2012.

"Então, minha pequena Amélie... Você não tem ossos de vidro. Pode levar umas pancadas da vida."

Quem já viu "O Fabuloso Destino de Amélie Poulain" sabe o que o pintor diz a respeito da menina que está com o copo. Todo ano ele pinta um quadro desses e nunca consegue captar a essência da menina do copo. Ele diz que ela está ali, mas não parece estar. Tem um olhar perdido, indecifrável.



Estar ali e não estar é a história da minha vida.

15.5.21

ligando uma coisa à outra

 Este texto foi originalmente publicado no blog Em Quantos no dia 7 de maio de 2012.

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Não existe tema mais atual do que a tecnologia e o quanto ela influencia nossas vidas. Acredito que a gente esteja em um momento onde somos bombardeados com um novo modelo de qualquer coisa que parece vinda diretamente dos anos 3000 para 2012 até que no dia seguinte esse "novo modelo" é substituído por outro. E assim a publicidade nos faz querer um celular/uma câmera digital/um laptop novo a cada dia. O mesmo ocorre com os assuntos nas redes sociais: hoje estamos comentando exaustivamente o assassinato brutal de uma criança de classe média e amanhã só falamos sobre a mulher que matou um cachorro à pauladas. Mas não é sobre isso que eu quero falar. O que me levou a escrever esse texto foi um conceito (ou uma ideia, sei lá) muito associado à internet: links.

Você resolve pesquisar na internet uma crítica sobre um filme que você quer muito ver e prefere se certificar antes se ele tem sido elogiado ou não. No site da crítica sobre o filme tem um link para uma outra página que fala sobre o ator principal desse filme. Nessa página há o link para várias matérias sobre ele, uma delas aborda sua experiência numa clínica de reabilitação. Você decide ler sobre isso e ao lado dessa matéria aparece um destaque sobre uma mulher que fugiu da reabilitação pela porta da frente e daí você se direciona para um vídeo do YouTube que mostra o flagrante de uma câmera interna de um assassino fugindo da cadeia e daí pra uma matéria de um telejornal sobre a utilidade das câmeras internas e de câmeras internas você acaba lendo uma entrevista de um BBB falando sobre a experiência de usar o banheiro sendo filmado. Então você começou querendo apenas saber se o filme era bom e terminou sabendo que algumas pessoas simplesmente não se importam em cagar diante das câmeras.

Da internet pra vida: ligando uma coisa à outra. Fui assistir Titanic e notei que Jack e Rose eram opostos em estilos de vida (rica e pobre) e personalidade (triste e feliz), mas que eles tinham um ponto em comum: as artes. Jack desenhava, Rose apreciava pinturas. Ela aparece colocando obras de Picasso em seu quarto. Pensei que Picasso é muito famoso hoje em dia e que eu não saberia reconhecer suas obras. Cheguei em casa e resolvi pesquisar algo a respeito dele.

Descobri que o seu nome é imenso:
Pablo Diego José Francisco de Paula Juan Nepomuceno María de los Remedios Cipriano de la Santísima Trinidad Ruiz y Picasso. 

Que ele tinha cara de pintor mesmo:


E que eu me vejo em algumas obras suas:
Les deux saltimbanques, 1901

Women Running on the Beach, 1922


Alguns links são bacanas, né?