[Data original do texto: 25/04/2017]
Assisti "Era o Hotel Cambridge" no Festival de Cinema de Tiradentes em janeiro deste ano. Carmen Silva, líder da Frente de Luta pela Moradia (FLM), que interpreta a si mesma no filme, estava presente e emocionada com esta obra que mistura ficção e realidade. O impacto do filme sobre mim foi tanto que, de volta ao Rio, eu fui mais duas vezes ao cinema assistí-lo. Além da importância de sua direção feminina (Eliane Caffé), a relevância do filme está em sua capacidade de gerar empatia no espectador, especialmente em tempos de avanço de um discurso de extrema direita.
O abandonado Hotel Cambridge foi ocupado por sem-tetos e refugiados e a história do filme se passa sob a ameaça de reintegração de posse. Ao abordar a ocupação de espaços urbanos abandonados e o preconceito e descaso em relação aos refugiados, o filme humaniza as personagens mostrando seu cotidiano. Apesar dos inevitáveis conflitos, a convivência entre os moradores é pautada em uma solidariedade característica de espaços onde, por se ter pouco, a colaboração é necessária.
O filme não erra ao trazer para sua história o mundo online, quando os moradores se organizam para publicar conteúdo a fim de divulgar sua luta e realidade. É através dos comentários de ódio lidos por Apolo (José Dumont) que vemos o senso comum que rotula os movimentos sociais e as pessoas mais prejudicadas pela desigualdade social de "vagabundos". Fica evidente o abismo existente entre quem são realmente aquelas pessoas e a forma como a sociedade as vê. E aí entra um ponto importante: a reivindicação por moradia e a luta social e política incomodam ao tornar visíveis aqueles que a nossa lógica de sociedade insiste em invisibilizar.