[Data original do texto: 12/04/2017]
Este texto contém spoilers.
Acho válido pensar 13 Reasons Why como um olhar sobre a cultura do estupro, não negando que o debate central seja o suicídio mas conectando os acontecimentos para enxergar a ligação direta entre uma sociedade cuja cultura é machista e a morte de mulheres. Aí a gente pode refletir como os 13 motivos seriam outros não fosse a personagem principal ser do sexo feminino.
O entendimento de uma cultura do estupro parte da compreensão de que atitudes normalizadas em nosso dia a dia são parte da engrenagem de um sistema cujo produto é a violência contra a mulher. Por isso Hannah Baker começa seus motivos com uma foto num escorrega aonde sua calcinha aparece ou o seu nome numa lista feita por um rapaz de sua turma de ensino médio que atribui à ela o título de melhor traseiro e tem em seus últimos motivos o estupro que presencia e o estupro do qual é vítima. Uma vez que já sabemos estar vendo a história de uma adolescente que decidiu se matar, os primeiros motivos de Hannah tendem a parecer besteiras aos olhos daqueles que ainda não entenderam a engrenagem. Essa condução da história, que ganha profundidade ao longo dos episódios, foi o aspecto que me levou a fazer o link com a questão da cultura do estupro.
Sobre a polêmica que surgiu em torno da série não ser indicada para pessoas com depressão, eu discordo. Achei incapacitante ouvir categoricamente que eu não deveria ver a série por conta disso. Eu não estou desprovida da capacidade de decidir assistir ou não a um conteúdo por conta da minha depressão e não me sinto confortável quando vejo essa capacidade retirada de mim - e aqui vale dizer que é comum sermos colocados nesse lugar de passividade. Outro ponto é que ainda que entendamos o conceito de gatilho, a gente precisa ter cuidado para não cair na conclusão rasa de que é uma série o que leva uma pessoa a se matar. Não é, assim como o estupro não é cometido por alguém que destoa da realidade. Ambos os casos são produtos de uma lógica de sociedade que precisa ser repensada. E veja bem, colocar esses pingos no i's é diferente de recomendar a série às pessoas. Talvez o maior perigo se pensarmos em uma influência no espectador esteja no caráter punitivo das fitas de Hannah, uma vez que o público alvo da série é jovem.
Apesar de alguns personagens esteriotipados e do perceptível esticamento da história, a série torna-se importante ao trazer a questão do suicídio inserida num debate sobre o olhar negligente que muitas vezes temos para o período da adolescência. Joy Division na trilha sonora teve um efeito especial sobre mim, pois foi parte do que eu ouvia no meu ensino médio. 13 Reasons Why nos mostra uma jovem cuja narrativa de sua vida lhe é tomada e sem enxergar as possibilidades de retomá-la, a personagem acaba recorrendo ao suicídio, o que jamais deveria ser uma opção.